sexta-feira, 6 de maio de 2011

Ministro Chefe da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Eloi Ferreira de Araujo

PORRADÃO DE 20 traz...

O Ministro Chefe da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Eloi Ferreira de Araujo, fala sobre a aprovação do estatuto da igualdade racial , tema que vem sendo discutido no Brasil e causando muita polêmica . Apesar de ser acusado de golpista pelo senador do DEM Demóstenes ele afirma que :

"Os brancos abraçam a cultura do negro pelo samba, pela culinária, pela contribuição do negro pela dedicação, trabalho e disciplina. A grande parte da nação é de uma generosidade extraordinária". 

Boa Leitura!!! 



01 - A informação que se tem é que a Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) tem o menor orçamento do governo. Isso não diz respeito aos objetivos da criação e suas finalidades?
O orçamento da SEPPIR é o orçamento da União. Isto porque a SEPPIR transversaliza toda a política de promoção da igualdade racial com todos os órgãos. O orçamento da Seppir está na Educação, na Saúde, no Meio Ambiente, está na Ciência e Tecnologia, na Integração Nacional, na Habitação, assim como no Ministério das Cidades. O orçamento da Seppir compreende todo o orçamento da União, porque, aí sim, temos um orçamento para poder fazer a promoção da igualdade racial. A responsabilidade de realizar a promoção da igualdade racial é do Estado brasileiro, é uma responsabilidade do governo como um todo. Por isso nós precisamos ter um orçamento aqui (na SEPPIR) que nos permita fazer o custeio, apoiar algumas iniciativas que são mais rápidas, que são mais breves. Mas precisamos buscar, sobretudo, que o orçamento da União contemple cada vez mais, e em mais órgãos, as políticas de promoção da igualdade racial.


02. Qual é a relação entre a Seppir e o movimento negro?  

O movimento negro é autônomo para as suas reflexões e decisões. A SEPPIR é Governo. Esta separação é boa para a democracia. O diálogo intenso e o respeito mútuo tem pautado esta relação. Agora, o movimento social através do Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial - CNPIR -, que é integrado por organizações Quilombolas, de Terreiros, de Trabalhadores, de Jovens, de Mulheres, de Ciganos, de Árabes, de Judeus e de Indígenas, auxilia a SEPPIR na formulação e implementação de políticas de promoção da igualdade racial. 

03. Não concorda que devemos separar a questão social das questões raciais? 

Separar as questões sociais das raciais? Olha, é preciso observar o seguinte: cerca de 52 milhões de brasileiros são beneficiários do programa Bolsa Família, um programa de caráter universal que alcança um número expressivo de pessoas. Ocorre que 70% desses 52 milhões de brasileiros são pretos e pardos. Então, na base da pirâmide social está a população negra, e essa população de pretos e pardos está na base da pirâmide como resultado, derivação do que foi a escravidão que durou até 1888 e não construiu a inclusão de negros e negras. Portanto, trabalhar na inclusão de negros e negras é trabalhar na superação da pobreza e redução de todas as desigualdades. 


04 -  A Seppir tem três gestões: Matilde Ribeiro, Edson Santos e agora o senhor. Não acha que o outro lado do Brasil deveria ser contemplado nessa direção?  

Se estamos nos referindo a uma perspectiva regionalista, das cinco regiões do nosso país, eu acho que precisa ser observado que nós não pensamos políticas de promoção de igualdade racial somente para o sudeste ou nordeste. Nós pensamos políticas de promoção de igualdade racial e de igualdade de oportunidades, de superação do racismo, das discriminações e dos preconceitos para todo Brasil. Quando pensamos nas políticas de promoção de igualdade racial, também incluímos na nossa meta, na nossa missão, os indígenas, os ciganos, as religiões de matriz africana. Incluímos todos para poder avançar na construção da igualdade em nosso país. O presidente nasceu em Garanhuns, passou a vida em São Paulo e hoje governa o Brasil de Brasília. Precisamos agora ter um presidente do Rio Grande ou do Amazonas? Não é isso. Precisa-se ter governantes e seus colaboradores com compromisso com as causas do povo brasileiro e com as causas nacionais. 

05 - Não existe um só parlamentar do DEM que seja favorável às cotas, e não me lembro agora de nenhum petista contra as cotas. Essa luta é baseada numa luta de partido?  

Ao que sabemos, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, por exemplo, é simpático a cotas. Ao que sabemos também, quando foi aprovado o Estatuto da Igualdade Racial na Câmara dos Deputados, os parlamentares do DEM também se manifestaram favoráveis às cotas. O que podemos afirmar, com certeza, sem medo de errar é que 100% do Partido dos Trabalhadores tem compromisso com a promoção da políticas de igualdade racial e seguramente tem um compromisso com políticas de ação afirmativa, e, entre essas, a política de cotas está incluída. 
06. - Num país tão misturado o senhor não acha impossível definir quem é negro e branco?  

Impossível, não. Acho que basta observar a realidade ao nosso redor. Quer saber quem é negro? Se tiver dúvida em relação à cor, basta visitar os presídios, visitar as comunidades mais populares, como as favelas e periferias da cidade. Agora, se quiser saber quem não é negro, basta visitar grandes universidades, grandes empresas, grandes bancos..

A exclusão, a crueldade do Brasil é a de não dar visibilidade aos negros ou dar somente nas situações de desigualdade e de desvantagem. 


07 -  Ministro qual foi a contribuição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso nesse tema?  

Sua Excelência FHC não acabou com a Fundação Cultural Palmares. Deu uma contribuição ao final do governo, quase no apagar das luzes, de pensar num decreto da empregabilidade para negros e negras. Não ofendeu a luta pela promoção da igualdade racial, mas também não deu a ela nenhuma ênfase concreta.


08. Lutar por cotas não significa assumir que os negros são inferiores?  

É óbvio que não. Essa é uma questão de uma importância que transcende tudo. Na década de 60 houve uma lei de cotas que se chamava "lei do boi". Essa lei previa que 50% das vagas dos cursos de ciências agrárias deveriam ser destinadas à população que fosse oriunda do meio rural, estudantes do meio rural, proprietários de terra, enfim, setores que estavam naquela realidade. Essa lei durou até a década de 80. Ocorre, então, que os proprietários de terra que foram beneficiários daquela lei de cotas nunca foram considerados desqualificados, eles tiveram êxito daquela ação afirmativa para ingressar na universidade. À "lei do boi" nunca recebeu uma vírgula de ataque, nenhuma. Agora, para colocar negros na universidade, sofremos todos os ataques. 


09-  Não seria uma forma de discriminação às avessas?  

Nós queremos cotas para ingressar na universidade, não cotas para sair dela formados. Até porque depois que a gente ingressa na universidade nós haveremos de sair dela qualificados, por competência, por mérito. E a política de cotas tem demonstrado nesses últimos sete anos que o ingresso de estudantes pretos e pardos tem sido extraordinário, pelo desempenho, pela dedicação, pela freqüência às aulas, a despeito das dificuldades para poder experimentar, para viver naquele ambiente que sempre foi muito elitizado. Mas aqueles estudantes pretos e pardos, quando ingressam na universidade, levam consigo a cor do Brasil e o sonho de dias melhores para o país. 

10. - Não existe um movimento branco, no entanto, os brancos ajudam a pagar as contas dos movimentos negros, pois eles são viabilizados muitas vezes com o dinheiro público. Você acha isso certo, e por que os brancos não reclamam? Sobretudo os que não aceitam as cotas.  

Interessante observar que uma classe média alta, ou classe média média coloca seu filho numa escola particular e o Estado restitui a essa pessoa os gastos com a mensalidade na hora em que vai pagar o imposto de renda, através da dedução fiscal. Então, a pessoa busca a escola particular e recebe um beneficio para manter o filho nela. Olha que bonito! E ninguém fala sobre isso. Com relação aos movimentos negros, estes, historicamente, desde as organizações secretas no período escravocrata para comprar alforrias, sempre foram mantidos com os esforços da militância, até mesmo para poder não serem confundidos. Apoiar uma ou outra iniciativa de organizações do movimento negro faz parte porque organizações de defesa do meio ambiente, de defesa de pessoas com deficiência, de defesa da mulher são apoiadas. Vez por outra é votada no Congresso brasileiro uma lei de perdão de dívida rural. Então, tem que se pensar que, quando se apóia o movimento negro está se apoiando organizações democráticas que tem o propósito de avançar na promoção da igualdade racial, com o objetivo de reparar desigualdades históricas que esse segmento experimenta. 


11.  O senhor acha que existe uma resistência ao movimento negro?  

A resistência que existe em relação ao movimento negro é daqueles que, seguramente, tem inspiração na Casa Grande, mas a maioria dos brasileiros não tem essa inspiração, aplaudem todas as manifestações desta parcela da militância, da população. Tanto aplaudem, que abraçam a cultura do negro pelo samba, abraçam a contribuição do negro pela culinária, abraçam contribuição do negro pela dedicação, pelo trabalho, pela disciplina. A maior parte da nação é de uma generosidade extraordinária e é por isso que essa nação é maravilhosa desse jeito. 

12. O Estatuto da Igualdade Racial que será sancionado pelo Presidente da República no dia 20 de julho gerou muita polêmica. Por quê a SEPPIR comprou a briga da aprovação?  

O Sr. Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva criou a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) em 2003. A partir de então, passou a existir, no âmbito do Estado brasileiro, um organismo que atua transversalmente junto a diversos ministérios em prol da reversão das desigualdades raciais em nosso país, como já disse anteriormente. É um órgão do governo responsável por oferecer subsídios para que se elabore, além de se acompanhar e coordenar, políticas públicas voltadas para a equiparação de oportunidades em favor dos afro- brasileiros na direção da igualdade racial. Nestas três gestões, nosso trabalho tem sido voltado para este contingente numericamente majoritário, e historicamente destituído de uma série de direitos, como já dissemos. A recente aprovação do Estatuto da Igualdade Racial está entre as conquistas em relação às populações negras nas quais o movimento negro e a SEPPIR estão envolvidos. Neste processo caminhamos ao lado deste segmento da sociedade civil organizada cuja luta por medidas reparatórias e contra o racismo e a discriminação racial vem de longa data. Luta esta encampada pelo governo. O Estatuto passou dez longos anos de tramitação entre as duas casas legislativas do país, e foi aprovado pelo Senado Federal por unanimidade, em 16 de junho de 2006. Já não sem tempo. Isto porque, após a sanção da Lei Áurea que aboliu a escravidão, em 1888, libertando quase um milhão de escravos, do dia 14 de maio daquele ano, até hoje, os ex- escravos e seus descendentes não se integraram como cidadãos de fato na sociedade. O Estatuto é primeira lei a estabelecer, 122 anos depois da assinatura da lei pela Princesa Isabel, uma nova ordem de direitos à população negra brasileira. E isto é um avanço inegável. O Estatuto é um documento extraordinário, moderno, que vai atingir cerca de 90 milhões de pessoas garantindo-lhes, legalmente, direitos e oportunidades que lhes vem sendo negados ao longo de todo este tempo. Por isto lutamos por sua aprovação e vibramos com sua sanção pelo Presidente Lula.


 13- O que valeu a pena nesse Estatuto da Igualdade Racial?  

No Estatuto da Igualdade Racial valeu a pena tudo. Ele é fantástico. É um documento bonito, é um documento poético. É um documento, sobretudo de ação afirmativa e que cria as condições para reparação das desigualdades raciais, das desigualdades sociais. Ele leva a população negra a elevar sua autoestima e a construir um futuro de igualdade. Ele atua na educação, na cultura, na saúde, na moradia, no direito à justiça e à segurança, na defesa das comunidades de religiões de matriz africana, na defesa das terras quilombolas. É um documento do qual, assim que a nação e o movimento negro em especial se apoderarem do conteúdo, levará a uma grande mudança. O país estará escrevendo uma nova página que vai ficar marcada para sempre, consolidando em definitivo a democracia com a inclusão dos segmentos que foram historicamente invisibilizados e desapropriados das possibilidades de fruir dos bens econômicos, culturais e sociais que sempre estiveram disponíveis, mas impedidos aos negros. 


14 -  Num país onde lei não pega e o negro ainda é tão desvalorizado, como podemos confiar que aquilo que o Estatuto prevê vai vingar?
A nova lei, além de oferecer subsídios para o enfrentamento do preconceito e discriminação, que atingem a população negra no seu cotidiano, incorpora as ações afirmativas no mundo jurídico brasileiro e os meios para sua implementação, envolvendo todos os poderes da República em sua efetivação. O que queremos dizer é que o Estatuto provocará alterações jurídico-políticas em toda a estrutura federativa do país: no Executivo, no Legislativo, no Judiciário, nos Governos Federal, Estaduais e Municipais. Mas evidentemente que a sociedade precisa tomar posse deste documento, conhecê-lo, entendê-lo. Só assim poderemos nos mobilizar para continuar a aperfeiçoá- lo, durante o processo de regulamentação. Esta lei é um instrumento que reconhece a existência do racismo e do preconceito racial, com isto, pauta a sociedade para a discussão do assunto e define medidas legais para a superação deste grave problema. Este é um desejo que acreditamos ser o de todos os brasileiros de bem. Milhões de homens e mulheres que desejam ver o Brasil avançar. Mas não só do ponto de vista do progresso econômico, tecnológico, mas também da justiça social, com a nação trilhando um caminho que leve à inclusão de todos. 

15.  Você fez um debate há pouco tempo com o senador Demóstenes do DEM e ele afirmou que o senhor estava dando um golpe junto com o governo. Por que ele disse isso?  

Eu acho que foi uma palavra forte que o senador usou e que eu não utilizaria, acho imprópria, porque se trata de um debate acerca do Estatuto da Igualdade Racial. Do Estatuto, o senador queria que fosse retirada a palavra cota, a palavra foi tirada. Ocorre que cota não é sinônimo de ação afirmativa, cota é tipo, é forma, cota é espécie, cota é uma modalidade de ação afirmativa, e com a ação afirmativa sendo implementada nós temos um avanço extraordinário. A ação afirmativa está plenamente definida e confirmada no Estatuto da Igualdade Racial. Ou seja, a definição ali presente, enquanto uma diretriz de ação governamental, aponta concretamente para a construção de responsabilidade do governo de estabelecimento de cotas e de quaisquer outras modalidades de ações afirmativas para promoção de igualdade racial. O senador não considerou dessa forma, acha que isso não deveria ser observado, contudo o texto legal não deixa dúvidas, o texto é explícito. Ele determina que o governo deverá adotar ações afirmativas no ensino superior, e se cota é uma modalidade de ação afirmativa, então vamos em frente avançar na consolidação da democracia com a inclusão de negros via as possibilidades contidas no Estatuto da Igualdade Racial. 


16. - O senhor acha que é possível um parlamentar negro do DEM ser a favor das cotas? Ou um parlamentar negro do DEM ser a favor das cotas é uma orientação do partido? 

Como eu disse anteriormente, na Câmara dos Deputados quando foi aprovado o Estatuto, este o foi por unanimidade e com votos dos parlamentares do DEM. Como eu também disse anteriormente, me parece que o prefeito Kassab é a favor de cotas, e ele é do DEM. "


17. Cotas para negros são defendidas apenas pelos próprios negros e por isso é tão difícil aprová-las?  

É preciso observar que, neste ano, comemoramos o centenário de morte de Joaquim Nabuco, um dos mais destacados abolicionistas. E que ele, branco, foi uma figura destacada que nós tivemos na luta contra a escravidão. Então, não é possível imaginar, é falso imaginar, que brancos são contra inclusão, que são contra cotas e que somente os negros são favoráveis. Isso é falso. O que é preciso é uma consciência democrática e cidadã, de reparar o mal da desigualdade racial, o mal da escravidão que ainda nos persegue até os dias de hoje. E isso une brasileiros, negros e não negros. Ou seja, o que nos une é a formação de uma nação democrática com a inclusão de todos. Negros e não negros irmanados e ombreados na construção de um Brasil unido e democrático, e, sobretudo, comprometidos com a construção de um ambiente de paz, fraternidade e igualdade de oportunidades para todos. Agora, eu não sou a melhor pessoa para saber da opinião dos integrantes do DEM. Eu sou do Partido dos Trabalhadores, e o que garanto é que nós somos a favor das Ações Afirmativas com cotas. 


18. Num país como o Brasil, com tantos brasileiros pobres e vítimas de injustiças, havia de fato necessidade de se criar uma lei voltada para os direitos dos negros?  

É importante que se acompanhe os resultados das pesquisas censitárias e demais levantamentos e estudos com recorte racial, realizados e amplamente divulgados por nossos institutos e centros acadêmicos nos últimos anos. O Estatuto da Igualdade Racial refere-se àquela parcela da população que, de uma forma sofrida e injusta, vem amargando, há séculos, as conseqüências da desigualdade de acesso a direitos fundamentais, tais como: educação, saúde, moradia, segurança, trabalho, entre outros itens. Era necessário que o Estado brasileiro assumisse definitivamente este problema de forma a superá-lo. Encampado pelo governo, o Estatuto é uma lei que assegura a criação e desenvolvimento de políticas públicas, as quais darão condições de cidadania a milhões de negros e negras brasileiros. Parcela da população que representa 50,6% do povo do país. É uma massa enorme de pessoas. As mesmas que estão localizadas, majoritariamente, na base da nossa pirâmide social, ocupando, por exemplo, as favelas e periferias. Aqueles mesmos brasileiros que se encontram no mercado de trabalho nos postos de mais baixa remuneração. Aqueles que são a maioria nos presídios. Os mais defasados no que se refere à qualificação profissional e o acesso à educação de qualidade. Em sua defesa há um argumento incontestável: trata-se de uma lei destinada a uma enorme parcela de brasileiros destituídos de quase tudo e que precisam ter seus direitos conquistados. 


19. Já passados 122 anos da abolição da escravidão, podemos continuar fazendo referência ao período em que os negros foram escravos como responsável pela situação atual?  

Isto também já foi amplamente constatado. O quadro atual em que vivem os negros é fruto, por um lado, do próprio processo de formação da sociedade do país. Por outro, pelas práticas de discriminação e pelo preconceito ainda vigentes. O que vem sendo explicado pelos nossos acadêmicos e estudiosos é que o racismo foi um fator estruturante de nosso modelo de sociedade. Desde o Brasil Colônia, a repartição de lugares, postos, benesses, terras, oportunidades dividiu a nação. De um lado, aqueles que, na condição de descendentes dos colonizadores europeus, usufruíam e usufruem até hoje, de direitos e privilégios e mais privilégios. E cujas novas gerações mantiveram-se neste "lugar social" privilegiado. Do outro lado, estão os grupos destituídos. Entre eles, os índios e negros que ocupam, desde o início da nossa sociedade, os lugares sociais hierarquicamente inferiores: de escravos a todo aquele caracterizado como dos "subalternos". E mesmo passados todos estes anos, as questões que afligem os negros e negras brasileiros são, de um lado, conseqüência, sim, do processo escravista no Brasil. Os próprios estigmas que recaem sobre os negros, como pessoas intelectualmente inferiores, entre tantos outros, tem a ver com o passado de homens e mulheres que ergueram as bases da nação brasileira com o trabalho braçal ( e não intelectual), único opção que tinham na condição de escravos. 


20. Concretamente, o que os negros pobres podem esperar da nova lei?   

É importante que a sociedade esteja ciente de que o Estatuto prevê a adoção de programas e políticas reparatórias na educação, cultura, esporte e lazer, saúde, segurança, trabalho, moradia, meios de comunicação de massa, financiamento públicos, acesso à terra, à justiça, e outros. Vai incorporar as ações afirmativas no mundo jurídico brasileiro e os meios para sua implementação, envolvendo todos os poderes da República em sua efetivação. O documento define ações afirmativas como programas e medidas especiais adotados pelo Estado e pela iniciativa privada para a correção das desigualdades raciais e para a promoção da igualdade de oportunidades. E assegura que tais ações deverão ser efetivadas. Também estabelece que os programas de ação afirmativa vão se constituir em políticas públicas destinadas a reparar as distorções e desigualdades sociais e demais práticas discriminatórias adotadas, tanto na esfera pública quanto privada, durante o processo de formação social do País. E entre o conjunto de medidas que devem ser adotadas estão as cotas, as pontuações por locais de moradia, de formação escolar, de renda familiar, entre outras. 

Na aérea da saúde, entre várias outras garantias, o Estatuto assegura, por exemplo, o estudo e pesquisa sobre o racismo e saúde da população negra, bem como acesso universal e igualitário ao SUS para promoção, proteção e recuperação da saúde desta parcela do povo do país. Os moradores das comunidades de remanescentes dequilombos serão beneficiários de incentivos específicos para a garantia do direito à saúde, incluindo melhorias nas condições ambientais, no saneamento básico, na segurança alimentar e nutricional e na atenção integral à saúde. 

O Estado também adotará, a partir do Estatuto, medidas especiais para coibir a violência policial incidente sobre a população negra e implementará ações de ressocialização e proteção da juventude negra em conflito com a lei e exposta a experiências de exclusão social. Ainda no que se refere às novas gerações, o Estatuto reafirma a Lei 10.639/2003, que torna obrigatória a implementação da disciplina história da África e Cultura Afro- brasileira nas escolas públicas e privadas. Com isto potencializa as oportunidades de nossos jovens, adolescentes, crianças fortalecerem a auto-estima, fundamental para que possam se considerar legítimas merecedoras de oportunidades e lutem por seus sonhos. Já que, legalmente, o Estatuto já lhes assegura os direitos para realizá-los. Por isto na nova lei também estão garantidas as ações afirmativas para a ampliação do acesso da população negra ao ensino gratuito, assim como o fomento à pesquisa e à pós-graduação com incentivos a programas de estudos voltados para temas referentes às relações étnicas. Além de programas para aproximação de jovens negros e negras às tecnologias avançadas. 

Há mais! Os remanescentes das comunidades dos quilombos que estão ocupando suas terras terão a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir os títulos respectivos. A nova lei também garante o acesso à moradia pela população negra que vive nas favelas, cortiços, áreas urbanas subutilizadas, degradadas ou em processo de degradação. Assim como a população negra recebera assistência técnica e jurídica para a construção, reforma ou regularização fundiária de suas habitações. Ficam asseguradas, ainda, pelo poder público, a realização de ações que garantam a igualdade de oportunidades também no mercado de trabalho para a população negra. Bem como a elevação do nível de escolaridade e qualificação profissional dos que integram os setores da economia contém alto índice de ocupação por trabalhadores negros de baixa escolarização, incluindo entre os beneficiários, as trabalhadoras domésticas. 

Estes são alguns dos avanços trazidos pela nova lei que, repetimos, é moderna e ampla o suficiente, para que seja pavimentada, com a contribuição de toda a sociedade brasileira, uma nação mais justa, mais desenvolvida, mais harmoniosa e fraterna, com todos os segmentos da população usufruindo de direitos e oportunidades de forma igualitária. 

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